O abismo entre declarar e fazer
10/12/2008
Hoje a Declaração Universal dos Direitos Humanos faz 60 anos, velha ela, né? Em todos os sentidos. A idéia é boa, mas, como toda idéia, seria melhor se realmente fosse colocada em prática. Eu fico me perguntando como a população do mundo se baseia nela para se defender se as pessoas em geral ainda não se respeitam. Para que serve uma declaração macro como essa se as relações interpessoais ainda não têm um nível mínimo de respeito?Ok, muito se avançou nessas seis décadas e muitas conquistas foram pautadas pelos tópicos que formam o documento assinado por 129 países. Mas não dá pra fechar os olhos, fazer festa e comemorar uma coisa que efetivamente não deu certo. Estamos falando de uma decisão, a de respeitar o outro, basicamente, que já é oficial há tanto tempo, mas que parece não ter sido levada em conta.De nada adianta elaborar um texto lindo, cheio de esperança e palavras de otimismo se a população que a recebe não sabe colocá-la em prática. Assim como o Anarquismo, Socialismo e tantas outras idéias que se afundaram quando colocadas em práticas, a Declaração precisa encontrar um campo que seja capaz de dar frutos, não um terreno ressecado pela intolerância e inóspito de tanta falta de respeito.Os Direitos Humanos devem ser respeitados todos os dias, nas pequenas ações é que se prova que todos são iguais. É tendo paciência para a senhora entrar no metrô, mesmo que todo mundo te empurre querendo também empurrar a senhora, é agradecendo um pequeno gesto e valorizando e incentivando a boa educação, é chamando a trans pelo nome social, é não jogando lixo na rua e demonstrando que você está preocupado com o futuro do planeta.É não discriminando (no caso dos gays, isso chega a ser inaceitável) alguém porque se veste com roupas de loja de departamento, ou que tem a pele mais escura, ou que tem o cabelo crespo, ou que mora na Zona tal, ou que, enfim, não se encaixe no padrão branco/judaico-cristão/heterossexual/capitalista. A idéia de declarar os direitos do ser humano, o que deveria estar na educação básica de cada um, dispensando o documento, é louvável, é ótima e necessária. Mas, infelizmente e por diversos fatores, a prática nem sempre acompanha a idéia.Já fui repórter policial e visitava freqüentemente presídios e cadeias (existe uma diferença, para quem não sabe). Há um abismo entre o documento adornado por anjos e a realidade do ser humano que está ali. Não discutindo a imputabilidade deles, os presos são, por exemplo, a prova de que é preciso mais do que declarar, mas exercitar os Direitos Humanos. Se todos são iguais perante Deus, a Lei e os governos, nada melhor do que um mutirão para rever a situação legal dos detentos, que em sua maioria já cumpriram pena ou poderiam estar em um regime semi-aberto, mas não, para comemorar essas seis décadas de direitos.A tal massa amorfa, que se perde em meio a tanta informação, muitas vezes não consegue ver que leis, declarações, decisões e ideologias, por mais louváveis e benéficas que sejam, só servem se forem praticadas. Afinal, de decisões judiciais nobres e leis importantes os arquivos públicos estão cheios, assim como, de outro lado, os arquivos das polícias, dos Procons e do Judiciário em geral, só para ficar em alguns âmbitos. Sou a favor da Declaração, por mais que não pareça, mas só se ela for realmente efetiva, não apenas decorativa e bonita.Acho que estou meio cansado dessa hipocrisia das decisões feitas só para homens poderosos posarem de bonzinhos e saírem bem na foto enquanto seu povo é escravizado, passa fome, não tem emprego, é discriminado, assaltado, seqüestrado... Cansei mesmo de ver gente sorrindo na foto enquanto o povão, com o perdão da palavra, se fode. Não quero mais bater palmas para teatrinhos onde todo mundo é bonzinho, ama todo mundo independente de sua cor, raça, credo ou orientação sexual, e vai fazer tudo para salvar o mundo. Não vou subestimar minha inteligência, não mesmo.
Escrito por Hélio Filho às 12h46
(1) Apenas 1 comentário
O rei é gay!
08/12/2008
(Julian, ao centro, egocêntrico, pintoso e cheio de jeitos)Sempre amei os desenhos que estréiam nos cinemas voltados para crianças, mas que, na verdade, só têm piadas que possam ser entendidas por adultos. Para mim, "Procurando Nemo" é o hours concours deles e uma continuação seria mais do que bem-vinda. Ontem fui ver "Madagascar 2", confesso que foi depois de rodar, rodar, rodar (lembrei da Leila Lopes) e rodar atrás do "Romance", do Guel Arraes, mas mesmo assim foi ótima escolha. Já tinha assistido ao primeiro e rachado de dar risada, parte pelas piadas ótimas, parte pela minha bobice para coisas televisivas mesmo. E não é que tinha uma colega no filme? O rei Julien é o personagem mais gay que eu já vi em um desenho animado desde, sei lá, Bambi, Robin? E eu nem catei essa no primeiro filme.Primeiro que ele passa o filme todo com um extravagante e super gay arranjo cor-de-rosa na cabeça - bem parecido com os das rainhas-de-bateria siliconadas de escolas de samba. Depois tem a mania de querer ser importante, VIP, rodeado de súditos e sem abrir mão de seu fiel companheiro, Maurice, conselheiro e seja lá mais quais funções ele desempenha no reino de Julien - tipo o Robin do Batman. Parece aquele povo de certas filas "VIPs" de certos clubes paulistanos. Com o rabo sempre levantado (adoro dubiedades), ele passa o filme todo mostrando seu lado estrela e andando em garças cor-de-rosa mega pintosas, e lindas.Em uma cena, vai ajudar a girafa hipocondríaca Melman a sair de um buraco onde estava para morrer e declarar o que sente para a hipopótamo seca e direta Gloria. Logo fica assustado, um pouco enojado, na verdade, ao saber que Melman ama a hipopótamo. Misoginia engraçada, leve. Graças à tecnologia de ponta usada nesses desenhos, os remelexos muuuito gays, expressões de diva do cinema e trejeitos ultra-afeminados ficam mais visíveis e engraçados.Mas mais do que isso, "Madagascar 2" é um filme ao qual devemos prestar atenção, e elogiar. Uma poderosa mensagem às crianças, que lotaram a sala onde eu estava e faziam questão de comentar cada mínimo passo dos personagens do filme (além de chorar, gritar, rir demais, falar demais, enfim, serem crianças), esse tipo de filme/desenho pode mudar a mentalidade delas. No filme, um pingüim se casa com uma dançarina havaiana de madeira sob a benção de que o amor ultrapassa todas as diferenças. O romance de Melman e Gloria também ensina que o amor não conhece regras, leis, normas, e muito menos espécies, já que estamos falando do amor entre uma girafa (que eu juraaava ser gay no primeiro filme) e uma hipopótamo.Gostei de ver essas mensagens implícitas em um tipo de filme que eu amo e não tenho vergonha em admitir que assisto. Fiquei mais feliz ainda porque as férias chegaram e, com elas, além de metrô vazio e ruas menos movimentadas, vários filmes infantis. Já vi três trailers de novidades que vêm por aí com coisas do tipo ratos cantando. Adoro a crítica social implícita e as piadas freudianas. Só não vou assistir ao da Xuxa (qual será o tema deste ano?), aí já é demais.
terça-feira, 18 de agosto de 2009
Assinar:
Postar comentários (Atom)

Nenhum comentário:
Postar um comentário