terça-feira, 19 de agosto de 2008

Babados barbados


Relato originalmente publicado no MixBrasil. Depois eu faço um mais quente, com mais detalhes, hoje estou sem cabeça para nada.

Sexta-feira, 15, eu chegava de mochila nas costas à Avenida Vieira de Carvalho, no centro de São Paulo, para embarcar em uma excursão diferente, inusitada e que prometia todo tipo de surpresa: a viagem organizada pela drag queen Salete Campari rumo a Juiz de Fora, Minas Gerais, para participar da Parada da cidade e do Miss Brasil Gay 2008. À espera do ônibus, com o doce nome de Caramelo e um tiozinho motorista que fazia cara de paisagem toda vez que alguém dava bafão, travestis exibiam grandes óculos, douradas bolsas e até casacos de pele. Como ainda era dia útil e horário comercial, nosso grupo já chamava atenção, mesmo em uma região acostumada á diversidade como a do Arouche.

Gays, solteiros e comprometidos (e aqueles que ficam no meio disso com seus relacionamentos abertos), fervidos e discretos, dividiam a expectativa com relação ao evento mineiro. “Vai ser babado”, “Não perco por nada” e “Vou aqüendar” eram as frases mais freqüentes. Três candidatas a miss também foram na viagem, sempre concentradas.

Depois de um pequeno atraso, cada um se aconchegou em um dos bancos e não demorou para o burburinho começar. A estilista Anthara Gold, que confecciona vestidos especialmente para candidatas, era uma das mais animadas e fervia com todos. “Vamos parar para almoçar daqui a duas horas e meia, não quero saber de gente enrolando na parada comprando bijouteria, maquiagem e meia-calça”.

No banco ao lado do meu, Kaká di Polly se mostrava fofíssima oferecendo sua provisão de remédios caso alguém tivesse dor de cabeça ou sentisse enjôo. Com sua experiência, ia relembrando algumas histórias impublicáveis sobre sua vida sexual em outras épocas. Um dos babados mais fortes foi sobre a inauguração do dark room da Blue Space. O roubo de uma peruca dela, “importada, caríssima”, durante um Carnaval também veio a público, fazendo todo mundo rir pencas.

O fervo, como sempre, ficou no fundo do ônibus. Quem quisesse dormir que procurasse outros bancos, ali era a área de fofocas, babados fortíssimos, troca de figurinhas sobre bofes e os vestidos das misses e avaliações sobre os concursos anteriores. Com a também estilista Michelly X, Anthara e Kaká formaram o trio que perpassou algumas edições passadas, apontando alguns erros (e erradas) e reconhecendo os acertos. É claro que também rolou muita paquera. Um colega de profissão não resistiu a um par de olhos verdes sentado ao seu lado e se jogou nos braços do rapaz. Um moreno, alto, bonito e sensual também não ficou sozinho bem perto de mim.

Posto 24
Na primeira parada da viagem, para o almoço, olhares curiosos percorriam o grupo que descia do Caramelo cheio de bolsas brilhantes, óculos escuros enormes, salto alto, cabelos esvoaçantes e um jeito manhoso de falar. “Mona, tá babado esse almoço”, dizia uma integrante do grupo sobre a polêmica provocada com nossa presença. Com aquela preguicinha de pós-almoço, muita gente dormiu, mas outros preferiram continuar nos beijos e abraços ou dividindo segredos por entre os bancos. Barbies, travestis, ursos, drag queens, misses... Quase toda a diversidade do mundo gay estava ali.

Chegando a Juiz de Fora, uma parte do povo ficou em um hotel, outro foi para um segundo e eu parei em um terceiro. Acho que a idéia dos organizadores era mesmo dividir esse povo todo. Imagina todo mundo junto em um mesmo hotel! Durante os três dias de eventos, nos encontrávamos esporadicamente em diferentes lugares para trocar figurinhas. “Nhaimmm, como está o fervo?” O colega de profissão foi um dos que mais aproveitou, alcançando uma marca considerável de conquistas amorosas, mas abafa!

Depois de Parada e Miss Brasil Gay, voltamos no domingo. Eu olhava as três candidatas, desmontadas, e não conseguia acreditar que aqueles garotos quietinhos que estavam sentados atrás de mim eram aquelas três transformistas super produzidas que subiram no palco do concurso. Não me contive e peguei a máquina fotográfica para conferir. “Essa é você?” “Sim, sou eu.” “Essa é você?” “Sim, sou eu!” Fiquei bege, ou melhor, fúcsia, como diria uma das novas amigas do ônibus.

No caminho de volta, não faltaram histórias a serem contadas. Algumas contabilizavam suas conquistas amorosas, outras contavam até que ponto a bebida pode deturpar (muito) a visão e outras, bom, é melhor não comentar, o horário não permite. Mas o mais legal é que não teve briga, nenhuma peruca voou, nenhum salto quebrou e nenhuma maquiagem borrou. Fomos e voltamos bem, voltamos melhores, na verdade, com algumas doses de whisky e vodca na cabeça e muita conversa fiada na ponta da língua. Teve gente que ainda encontrou energia para se jogar na Danger. Que venha a próxima! Ah sim, para não comprometer os viajantes, não tem álbum de fotos.

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